Spurs Brasil entrevista Alex Garcia

Os torcedores mais novos podem não saber, mas antes de Tiago Splitter um outro brasileiro já vestiu a camisa do San Antonio Spurs. E não foi Leandrinho, muito menos Nenê ou Anderson Varejão. Foi Alex Garcia, ala-armador da Seleção Brasileira, que, em 2003 recebeu um convite de Gregg Popovich e desembarcou no Texas. Depois de toda a fase de preparação e de disputar a pré-temporada pela equipe, o brasileiro sofreu uma grave lesão no pé ainda no início da temporada regular e viu o sonho acabar de forma indesejada.

Então com 23 anos, o atlético jogador, que hoje defende o Uniceub/BRB/Brasília, disputou apenas duas partidas oficiais pela franquia texana, registrando médias de 1,5 ponto e um roubo de bola em 6,5 minutos. O pouco tempo, porém, foi suficiente para deixar marcas no coração de Alex, que até hoje se declara um torcedor da equipe. E o Spurs Brasil foi ouvi-lo, para saber um pouquinho mais sobre a experiência de estar ao lado de lendas como Tim Duncan e Gregg Popovich. Confira a entrevista exclusiva:

Alex LL

Spurs Brasil: Você nasceu no interior de São Paulo (em Orlândia), começou a jogar no time de Ribeirão Preto e chegou até a NBA. Como foi realizar o sonho de estar entre os melhores do mundo?

Alex Garcia: Acho que foi diferente dos outros brasileiros, que fizeram toda aquela preparação para entrar no Draft. Em 2003, a gente jogou o Pré-Olímpico em Porto Rico e o primeiro jogo foi contra a seleção americana, que tinha o Gregg Popovich como assistente. E foi um jogo que acabei dando um toco no Tim Duncan. Muita gente fala, mas não foi só por esse lance. Acho que foi por toda a parte defensiva que eu me destaquei. E o Popovich me chamou. Foi uma coisa nova. Desde criança eu assistia NBA, comprava fitas… Então, foi uma passagem única.

SB: Você falou sobre o toco no Tim Duncan. Muita gente comenta sobre isso com você até hoje? Foi algo que realmente marcou?

AG: Até hoje, não só em Brasília, mas onde a gente vai jogar muita gente fala desse lance e diz que foi essa jogada que me levou para a NBA. Mas acho que não… Foi um lance bonito, lógico, uma coisa inesperada dar um toco no Tim Duncan. Fiquei feliz pelo momento, mas foi o destaque na parte defensiva que me levou para San Antonio.

Alex Spurs

SB: Quando você chegou na NBA, em 2003, o Spurs era o atual campeão. Como foi para você desembarcar em um momento em que os estrangeiros ainda não estavam em tão grande número e ainda mais em um time campeão?

AG: Foi difícil e foi fácil… Primeiro por causa da língua, que eu não sabia falar um “a” em inglês. Só que o Ginobili me ajudou muito. Ele ficava perto de mim, o que era falado nos treinamentos ele me passava em espanhol, a gente se falava muito. E o Popovich me dava muita tranquilidade para treinar. Não só o Popovich, mas o time todo me deixava à vontade. Depois, conseguiram uma professora de inglês e eu fui melhorando. Mas, ainda quando eu estava me adaptando ao estilo de como a equipe jogava, o estilo de cada jogador, eu acabei tendo a lesão no pé que me tirou da temporada.

SB: Além do Ginobili, quais jogadores você tinha mais contato? Como aquele elenco cheio de estrelas te recebeu?

AG: Todos me receberam muito bem. Fiquei muito à vontade. Como o time tinha muitos estrangeiros, isso facilitou. Mas todos, desde o Tim Duncan até o porteiro do centro de treinamento, me trataram muito bem. E quando eu vou para lá, sou sempre bem tratado e bem recebido. Fico feliz por isso, apesar de não ter conseguido mostrar nem metade do que eu poderia, fiz muitas amizades e sou lembrado até hoje.

SB: Você acha que se não fosse alesão que você teve, você acha que teria conseguido ficar mais tempo na NBA e dado certo no time de San Antonio?

AG: É difícil a gente falar, né? Eu vejo que nada é por acaso. Se a lesão veio naquele momento, era porque era vir naquele momento. Mas não fico chateado, não fico triste. O que eu queria mesmo era estar lá, treinando. Um dos fatores para ter uma lesão como a que eu tive (fratura por stress) foi porque eu estava treinando muito. Chegava cedo no CT, era um dos últimos a sair. Ficava treinando com os assistentes, antes e depois. Eu queria mostrar serviço, fazer o meu melhor.

SP: No seu segundo ano de NBA, você teve uma oportunidade no New Orleans Hornets. Qual foi exatamente a lesão que você sofreu lá?

AG: No Hornets, como eu já estava mais acostumado ao estilo da NBA, foi mais fácil, apesar de não ser um time de estrelas como o de San Antonio. E lá eu joguei muito mais. No Spurs joguei praticamente só a pré-temporada, no Hornets joguei mais jogos na temporada regular, alguns como titular. Estava mais familiarizado. E como o time era mais jovem, não era tão tático, era mais solto. Mas aí, no dia 12 de dezembro de 2004, em Washington, tive o ligamento cruzado do joelho esquerdo rompido.

SB: Você sempre foi conhecido pelo seu vigor físico e pela sua defesa, e na época que você passou por San Antonio o time tinha o Bruce Bowen, um dos melhores defensores que já passou pela NBA. Você teve oportunidade de trocar experiências e aprender algumas coisas com ele?

AG: De conversar, de perguntar mesmo, não. Porque eu era muito quieto, até mesmo pela dificuldade com o inglês. Mas eu observava muito. Nos treinamentos, eu via o que ele fazia, e tentava aproveitar, principalmente o uso das mãos. Como ele tem os braços muito longos, coisa que eu não tenho, ele usava muito os braços. Ele marcava desde um ala alto até o Allen Iverson, que é bem menor. Eu aprendi muito em San Antonio, não só com o Bowen, mas também com o Ginobili. E nos treinos eu marcava o Tony Parker, um armador rápido, que pra mim é o melhor da NBA hoje. Não tem nenhum armador com as características dele.

SB: Como era seu relacionamento com o Popovich? Ele carrega a fama de durão, de cobrar muito, então como foi essa convivência?

AG: Boa demais! Sempre me tratou muito bem. Claro, cobrava bastante, sabe da responsabilidade que tem e, pelo time que tem nas mãos, ele tem de cobrar mesmo. Às vezes, em viagens, ele mandava chamar eu e o Ginobili, e íamos jantar com a comissão técnica. Ele gostava de deixar a gente à vontade, nos treinos ele também chamava muito para conversar…

SB: Você ainda acompanha e torce pelo time? O que você está achando das atuações do Tiago Splitter?

AG: Acompanho bastante, sim. É o meu time favorito na NBA, que eu torço sempre, pelos amigos e pelo estilo de jogo. E o Tiago do ano passado para esse melhorou muito, tanto que vem sendo titular. A Europa é muito diferente da NBA, então essa adaptação leva um tempo mesmo. Esse ano o Popovich tem mais confiança e está deixando ele jogar. Eu acho que daqui a alguns anos, quando o Tim Duncan parar, ele é o substituto.

SB: Você mantêm contato com alguém do time?

AG: Contato, assim de ligar, não. Às vezes, quando a jogamos contra a Argentina, converso com o Ginobili. E quando tem alguma viagem, encontro algumas pessoas. O General Manager, o R.C. Buford, estava no Pré-Olímpico de Mar Del Plata, o Popovich estava no Mundial da Turquia… E sempre quando alguém vai lá, como o meu agente que na época era o mesmo que o do Tiago, o pessoal pergunta de mim. No final da temporada aqui do NBB, vou pegar a família e ir por Estados Unidos, aí vou aproveitar e fazer uma visita para o pessoal lá.

SB: Ano passado (2012) foi um ano muito especial para o basquete brasileiro, que voltou a disputar uma Olimpíada depois de muito tempo. Como foi para vocês, jogadores, essa volta do Brasil para a elite do basquete mundial?

AG: A gente ficou muito feliz. No Pré-Olímpico de Mar Del Plata tinha uma pressão enorme em cima da gente. E a gente sabia dessa pressão. Sabíamos que tínhamos de classificar em primeiro para evitar a Argentina na semifinal. E antes daquele jogo contra a República Dominicana, o da classificação, foi o dia todo tenso. Todo mundo estava tenso, nervoso, mas com muita vontade de ganhar. E deu tudo certo. A sensação de vencer aquela partida foi melhor que qualquer jogo das Olimpíadas. Foi emocionante.

SB: Com essa experiência que você teve com o Ruben Magnano (técnico da Seleção Brasileira), que como o Popovich é um técnico que exige muito nos treinos e cobra a parte defensiva, dá para traçar um paralelo entre esses dois treinadores?

AG: O jeito de cobrar é parecido. Eles sabem cobrar, mas também sabem dar o apoio quando precisa. Eu posso dizer que o Popovich e o Magnano têm uma semelhança no jeito de dirigir a equipe, e são dois técnicos vitoriosos. Aprendi muito com ambos. Em San Antonio, teve até um acontecimento que eu nunca vi… A gente tinha acabado de perder um jogo e foi todo mundo para o auditório, lá o Popovich deu esporro em todo mundo. E no outro dia, quando chegamos pra treinar, ele chamou de novo no mesmo auditório e deu um envelope para cada um. E dentro do envelope tinha dinheiro. Aí ele se desculpou por ter dado aquele esporro no dia anterior. Ele reconheceu que errou. Não pelo dinheiro, mas ele se desculpou e essa humildade ganha o grupo. São com essas coisas que o técnico tem o time na mão e se mandar o jogador bater a cabeça na parede, o jogador vai. Então, eu acho que tanto o Popovich quanto o Magnano têm uma filosofia de trabalho em que eles ganham o grupo e o que eles mandam o jogador fazer, ele faz.

SB: O Magnano já está garantido na Seleção para mais um ciclo Olímpico, até 2016. Está nos seus planos jogar a Olimpíada aqui no Brasil?

AG: Está, lógico. Não vai depender só de mim, mas eu sei que me cuido muito bem e tanto física quanto tecnicamente eu vou estar bem até lá. Mas depende do que ele vai querer, e tem muito jogador jovem aparecendo. Só que eu brinco que o que eu faço na Seleção ninguém gosta de fazer, é o que não aparece na estatística, é a parte “feia” do basquete, e eu gosto de fazer muito e me sinto bem.

SB: Você vai completar 33 anos em março, e tem um exemplo na NBA que é o Prigioni, que aos 35 anos é o novato mais velho na liga nos últimos 40 anos. Tendo isso como exemplo, você ainda pensa na NBA? Se tivesse mais um convite, você iria?

AG: Acho que iria, sim. Dependendo de como for, as possibilidades que existirem, voltaria com o maior prazer. Mas também estou muito bem em Brasília. Vou fazer 33 anos, minha família está adaptada, a equipe está fazendo um bom trabalho, e o NBB está sendo bem visto, bem divulgado, e todo mundo está se reforçando. Mas, lógico, se pintar uma proposta legal de algum clube, eu voltaria com o maior prazer.

* Colaborou: Pedro Suaide

Sobre Victor Moraes

Formado em Jornalismo no ano de 2012 pela Universidade Metodista de São Paulo. Fanático por esportes, sobretudo o basquete, passou pela redação do Diário Lance!, trabalhou na Liga Nacional de Basquete e no extinto Basketeria. Se orgulha de fazer parte da equipe do Spurs Brasil desde a criação em 2007.

Publicado em 13/02/2013, em Entrevistas e marcado como , . Adicione o link aos favoritos. 5 Comentários.

  1. Excelente entrevista! Deu pra saber mais sobre o time que amamos tanto!

  2. Mateus Heron

    Excelente, excelente mesmo essa entrevista! É sempre legal poder conhecer um pouco mais sobre os bastidores do time q a gente é fanático! Parabéns e mt, mt obrigado à equipe do Spurs Brasil por nos proporcionar essa e outras entrevistas!!

  3. Thanks for posting this interview, though I’m a huge fan of Argentina but still got lots of love for Brazil as we are neighbours.

  4. Gostaria que ele tivesse ficado mais tempo por lá. Talvez fosse um bom reserva pro Bowen, e nos ajudaria demais na transição entre a aposentadoria do Bowen e o achado do Leonard.
    De qualquer forma, vejam o que ele fala do Pop, como o treinador é humano, apesar de linha dura. Fico pensando se o Phil Jackson pediria desculpas a todo o elenco por um esporro exagerado…

  5. Duda Pereira

    Muito bacana a entrevista! Legal saber que apesar de ter ficado tão pouco por lá, ele é bastante querido. E não é por menos. Sou de Orlândia, conheço o Alex desde garoto, e sei o quanto ele é merecedor de tudo que conquistou na vida e na carreira!!!! Bacanaa!!!

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